A deterioração das relações humanas no cenário atual

Se algum brasileiro não estiver chocado e entristecido com os últimos acontecimentos do cenário político midiático deste mês de março, eu gostaria de conhecê-lo para aprender qual é a “fórmula mágica” que contribui com certo isolamento mental deste mundo tão caótico. Por enquanto, desconheço.

Em função dessa ignorância sobre como é possível alguém manter sua saúde mental intacta frente a tantos horrores diários, os quais somos praticamente obrigados a acompanhar, seja através da mídia digital ou da televisiva (diga-se de passagem, se não desligarmos nossos aparelhos eletrônicos, há barbaridades para todos os gostos em qualquer lugar do mundo), apelei mais uma vez para a escrita no sentido de provocar reflexão e compartilhar a angústia de ser apenas mais uma pessoa afetada/comovida neste universo estranho.   

Isto não significa que não existam notícias ou acontecimentos interessantes, do ponto de vista construtivo e não destrutivo, ocorrendo a todo momento. Com certeza há, porém não são destacados. A novela interminável de nossos líderes políticos, envolvendo as principais instituições brasileiras, parece não ter fim e definitivamente vem ocupando demasiado espaço em nosso cotidiano, em nossas relações familiares, profissionais e de amizade.

Lembro-me de ter saído da rede do facebook em 2014, na qual nunca mais voltei, embora nela mantenha uma página institucional. Percebo que agora todas as redes sociais, reais e virtuais, estão muito mais deterioradas e incrivelmente contaminadas pela partidarização política. Vale observar que antigamente ouvíamos alguns ditados populares do tipo: “brasileiro não se interessa por política”. Convenhamos, não é o que estamos atestando na prática!

Xingamentos, manifestações de ódio, incivilidades variadas e horripilantes crescem “criativamente” a cada dia, ao ponto de termos que pensar na cor da roupa que vamos usar, se verde amarela, se preta, se vermelha, se azul, posto que, como se não bastassem tantos rótulos com os quais temos que conviver, agora surgiu mais este: “você defende este ou aquele partido dependendo da cor da roupa que estiver usando”. 

Que tal pensar sobre isso com distanciamento? Não é um absurdo? Será que temos que nos definir dessa maneira tão reducionista? É verossímil considerarmos a identidade do outro a partir deste prisma?

Sou leitora contumaz de Kafka, considero-o o escritor mais completo que já existiu na humanidade. Ao lado de Kafka, também Camus apresenta-nos o homem como um “ser absurdo”. Mas a literatura de Kafka, muito além de Camus, engloba também o absurdo/patético/perverso sistema humano/político/ social como um todo. Neste momento, não há como não afirmar que a vida é “kafkiana”. Anseio no entanto, com imensa comoção, que a história não termine como O Processo, romance mais eloquente de Kafka. Para quem ainda não leu, fica a sugestão, com a ressalva de que Josef K, o personagem principal, pode representar qualquer um de nós. 

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